A Essência da Nutrição
Comer é algo inato ao ser humano, ou pelo menos, deveria ser, porém, a relação com a comida vem piorando a cada dia. Vivemos em um mundo em que o padrão de beleza ainda tem forte influência e dita a cultura da magreza. Soma-se a isso, o excesso de informações distorcidas que agravam a situação, reforçando o julgamento dos alimentos que, hora são considerados bons e hora ruins. Os alimentos passaram a ser vistos, principalmente, pelas suas características nutricionais, deixando de lado todo o contexto social, comportamental e afetivo. Isso inclui os alimentos super poderosos (que não existem) e os vilões (pão, farinha branca, chocolate, glúten, lactose e até as frutas já entraram na lista por causa da frutose).
A busca por corpos “adequados” tem adoecido a população, incentivando o senso comum que acredita que basta comer menos e se exercitar mais. Todo ano, uma nova dieta surge, porque a última falhou.
É necessário ficar claro que “sucesso” da dieta vai muito além da simples perda de peso.
Qualquer prática de restrição calórica por um período determinado pode levar à essa redução, porém, é importante ressaltar que as saúde bioquímica e mental não são preservadas com esse comportamento, agravando ainda mais o comer transtornado.
O corpo não sabe a diferença entre perder peso por causa da dieta e passar por um período de escassez. Ele se defende e cria mecanismos de adaptação, trazendo todo o peso de volta, ou ainda mais, após o fim da restrição.
Todo esse contexto gera um forte sentimento de fracasso, culpa, insatisfação corporal, episódios de exagero alimentar e a procura do próximo recurso para perder o peso novamente.
Por trás desse comportamento, encontramos pessoas que querem ser aceitas, não se sentem merecedoras e acreditam que serão felizes e satisfeitas após atingirem o resultado desejado.
A maioria dos meus pacientes é mulher. A sociedade pode ser cruel. Além de todos os papéis que temos, como por exemplo, ser mãe, esposa, filha, profissional bem sucedida, dona de casa ainda temos que ter um corpo que cabe em uma roupa com um tamanho minúsculo.
Vejo, todos os dias, mulheres lindas, que se julgam, têm medo de comer e engordar ou simplesmente não conseguem se controlar diante da comida. Vivem em um pensamento “tudo ou nada” e muitas vezes descontam todas as suas emoções na alimentação.
Não é uma crítica. As pessoas não sabem ainda como fazer diferente. Eu sei como é estar do outro lado, porque já estive lá. Passei anos testando várias dietas, principalmente na faculdade. Calculava cardápios milimetricamente planejados para seguir, mas isso só durava alguns dias. Bastava alguma situação sair diferente do programado para tudo ir por água abaixo e ser motivo para comer de qualquer jeito.
Uma nutrição tradicional com um cardápio só piora esse quadro exatamente por deixar a pessoa dependente das escolhas de terceiros e focar em uma rotina robotizada que prega a exclusão e o terrorismo. Mesmo que o planejamento alimentar venha com uma liberdade de escolha maior e uma lista de opções, ainda sim, é um comportamento de dieta que terá consequências futuras. Ninguém sabe quanta fome uma pessoa está sentindo sem ser ela mesma. Ninguém sabe a fundo a todos os sentimentos e verdades que cada um leva consigo sem ser a própria pessoa.
A fome emocional não é apenas ansiedade. Existe muito mais coisas que influenciam o comportamento alimentar do que se pode imaginar. Por isso a importância de entender que isso é um processo que merece atenção e cuidado no dia a dia, busca por autoconhecimento e ressignificação de crenças limitantes.
A nutrição comportamental e alimentação intuitiva resgatam a autonomia e o poder de escolha. A grande sacada é olhar para si, ir com calma e ter paciência para desconstruir toda uma cultura para construir um novo aprendizado de como funciona o próprio corpo. Olhar para dentro não é fácil e por isso muitas pessoas acabam buscando as alternativas mais imediatistas. Fica mais prático responsabilizar o alimento do que as próprias atitudes.
Acredito que nesse processo o resgate da autoestima, autoconfiança e amor próprio são peças chaves para tomarmos decisões mais assertivas e ações mais efetivas. Enquanto estivermos buscando resultado por odiar nosso corpo, só encontraremos frustração. Isso é assim em vários aspectos da vida e com a alimentação não poderia ser diferente.